— 16. Formalismo newtoniano e Equações de Euler-Lagrange —
Como vimos no artigo Mecânica Quântica Revisões IV ao utilizar as equações de Euler-Lagrange que descrevem um sistema mecânico chegamos às mesmas equações do formalismo newtoniao.
O objectivo deste secção é demonstrar de uma forma mais rigorosa que ambas as formulações da mecânica clássica são de facto equivalentes (ou dizendo de forma mais exacta: quais são as condições que tornam o formalismo newtoniano e o formalismo lagrangiano equivalentes para a mecânica clássica).
Já sabemos que é para
. Usando a definição de
podemos reescrever a equação do lagrangiano:
Uma vez que a nossa análise não depende do conjunto de coordenadas utilizado vamos escolher trabalhar com coordenadas rectangulares pois são matematicamente mais cómodas. Assim temos e
. Uma vez que é
e
vem que
. Para um sistema conservativo temos
.
Logo para é válido
Assim é que é a Segunda Lei de Newton (Segundo Axioma ou Segundo Postulado de Newton seriam nomes mais correctos…). No formalismo newtoniano da Mecânica Clássica o que dita a dinâmica de uma partícula é a segunda Lei de Newton, assim sendo acabámos de demonstrar que ambas as formulações são equivalentes.
— 17. Introdução à Simetria —
O leitor certamente notou no último exemplo que a ausência de uma coordenada generalizada no lagrangiano de um sistema implicaca a conservação de um momento (seja ele linear ou angular). Estas coordenadas que não aparecem no lagrangiano recebem o nome de coordenadas cíclicas.
Obviamente que a presença ou ausência de coordenadas cíclicas num lagrangiano depende da escolha de coordenadas. No entanto o facto de um momento ser conservado ou não, não pode depender da escolha do conjunto de coordenadas que se faz. Uma vez que a escolha acertada do conjunto de coordenadas nos permite revelar a simetria que os sistema exibe podemos concluir que que simetria e quantidades conservadas estão intimamente ligadas.
Nesta secção vamos entender por que motivo considerações de simetria são tão importantes na Física contemporânea e qual é a relação entre simetria e as leis de conservação.
Se um sistema exibe um qualquer tipo de simetria contínua então esta simetria irá sempre manifestar-se na forma de uma quantidade que se conserva. A demonstração matemática deste teorema (e as suas múltiplas generalizações) é o Teorema de Noether, mas não nos vamos debruçar sobre a demonstração neste texto. Ao invés vamos somente entender as consequências de três tipos de simetria contínua e o estudante interessado pode consultar os seguintes links para aprofundar o seu conhecimento mais teórico sobre este teorema:
— 17.1. Simetria contínua para translações no tempo —
Como sabemos da Mecânica Clássica um referencial diz-se inercial se o tempo é homogéneo. Quando dizemos que o tempo é homogéneo estamos a dizer que podemos fazer uma translação contínua ( formalmente dizemos ) no tempo e que as características mecânicas não sofrerão alterações.
Seja o lagrangiano de um sistema isolado. Uma vez que o sistema é isolado sabemos que as suas características mecânicas deverão permanecer invariantes no tempo. Isto é equivalente a dizermos que o seu lagrangiano não depende do tempo
Assim a derivada total é
Usando a equação de Euler-Lagrange 18 para coordenadas generalizadas fica:
Ou seja
Onde (o porquê de termos um sinal
será evidente dentro de momentos) é uma constante.
Vamos admitir que e
. Então é
e
. Logo
Então podemos escrever a equação 19 na forma
Donde vem que .
A função é o Hamiltoniano do sistema e a sua definição é dada pela equação 19.
Para além disso podemos identificar o Hamiltoniano com a energia total de um sistema quando as seguintes condições são respeitadas:
- As equações para as transformações de coordenadas são independentes do tempo. Isto implica que a energia cinética é uma função quadrática homogénea em
- A energia potencial não depende da velocidade. Desse modo os termos
podem ser eliminados
— 17.2. Simetria contínua para translações no espaço —
Sabemos também da Mecânica Clássica que para um referencial inercial o espaço é homogéneo. Quer isto dizer que todos os pontos do espaço são equivalentes e como tal o lagrangiano é invariante para translações no espaço. Formalmente escrevemos para
.
Sem perda de generalidade vamos somente considerar uma partícula. Neste caso é e
. Calculando a variação em
devido a
é
Ora e a expressão para a variação fica
Para a expressão anterior ser identicamente nula temos que ter , uma vez que
são variações arbitrárias.
De acordo com a Equação de Euler-Lagrange 18 temos .
Logo é
Assim a homogeneidade do espaço para translações implica a conservação do momento linear para um sistema isolado.
— 17.3. Simetria contínua para rotações no espaço —
Sabemos também da Mecânica Clássica que para um referencial inercial o espaço é isotrópico. Quando dizemos que o espaço é isotrópico estamos a dizer que não existem direcções privilegiadas. Ora isto quer dizer que o lagrangiano é invariante para rotações no espaço: para
onde
.
Considerando novamente uma só partícula sabemos que é
Para além disso também é
De e
segue que
Uma vez que
e , segue
.
Uma vez que é um vector arbitrário segue que
. Logo
é constante.
Em conclusão podemos dizer que a isotropia do espaço implica a conservação do momento angular. Outro resultado importante é que sempre que um sistema mecânico exibe um eixo de simetria o momento angular em torno desse eixo é uma quantidade conservada.
— 18. Dinâmica Hamiltoniana —
Como já vimos, se a energia potencial de um sistema não depende da velocidade então . Consequentemente podemos definir
Definição 7
Num sistema descrito por coordenadas generalizadas
|
Como consequência da definição anterior temos .
E podemos escrever o Hamiltoniano como uma transformada de Legendre do Lagrangiano
Uma vez que a equação 21 pode ser escrita na forma
Assim temos e
. O diferencial de
é
Calculando e
via 22 e substituindo em 23 é
Igualando os coeficientes de ,
e
vem:
e
Que são as equações canónicas de movimento. Quando usamos estas equações para estudar a evolução temporal de um sistema estamos a usar a Mecânica Hamiltoniana.
Temos . Para além disso temos também
o que implica que a função hamiltoniana não depende explicitamente de
. Logo
é uma quantidade conservada.
Exemplo 7
Uma partícula de massa
De
Para a velocidade temos
Assim o lagrangiano é and
Uma vez que este sistema é conservativo e as equações de transformações de coordenadas não dependem do tempo As equações de movimento são:
Das relações anteriores vemos que o momento angular em torno de
Também temos |
Para finalizar o nosso tratamento da Mecânica Clássica vamos só fazer um breve sumário da Dinâmica Lagrangiana e da Dinâmica Hamiltoniana:
- As coordenadas generalizadas e os respectivos momentos generalizados dizem-se coordenadas canónicas.
- Coordenadas que não aparecem explicitamente em
e
dizem-se coordenadas cíclicas.
- Uma coordenada que é cíclica implica sempre a existência de um momento generalizado conservado assim como um eixo de simetria.
- Simetrias de uma sistema estão sempre ligadas a uma lei de conservação